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CORAÇÃO DE ESTUDANTE

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Por Ney Vilella

11/08/2022

 

 

Meu carinho pelo dia 11 de agosto se inicia no já longínquo ano de 1974. Eu era calouro de engenharia e nesse dia o Centro Acadêmico Armando de Salles Oliveira, da minha escola, fez uma reunião para avaliar os acontecimentos do ano. Tínhamos feito a primeira greve estudantil pós AI-5; apanhamos bastante da polícia; mantínhamos um semanário impresso, uma cinemateca atuante, shows musicais frequentes e um cursinho pré-vestibular eficiente. Havia um grupo teatral se reunindo; grupos de debates; uma biblioteca estudantil razoável; atividades esportivas e sociais. Em suma, éramos felizes e sabíamos disso.
Nos anos seguintes, assumi algumas funções coadjuvantes, no Centro Acadêmico, e me tornei professor no curso pré-vestibular.

Quando a vida profissional chegou, decidi mudar de rumo e voltei a ser estudante, agora na área de história. O Diretório Acadêmico da Faculdade não era atuante, mas os bate-papos – nos botecos e nos ônibus – e as reuniões altamente informais com alguns professores ainda eram fontes de felicidade. Além disso, mantive o hábito, adquirido na primeira faculdade, de assistir a filmes e shows.E de frequentar bibliotecas, também.

Nos meus quarenta e tantos anos de vida profissional, fui um professor que tentou fazer com que os alunos tivessem uma vida acadêmica, uma vida de estudante. Consegui, em parte. Mas a cada ano que passava, percebia que os alunos estavam cada vez mais aprisionados às novas tecnologias, às injunções profissionais antecipadas no tempo, à insegurança do deslocamento nas cidades, ao empobrecimento cultural e econômico do nosso país.
Há uma estranha ironia nos tempos que correm: os jovens estão nas escolas por um número maior de anos e de horas, mas são – cada vez menos – participantes de uma vida acadêmica. Entram, em multidões cada vez maiores, nas faculdades, mas quase não adquirem hábitos de estudo e de fruição da cultura. São alunos, mas lhes roubaram o coração de estudantes.
Estamos diante de um fenômeno global? Decididamente, não! Nos EUA, os alunos, quase todos, se alojam dentro das universidades; estudantes franceses, tchecos e alemães seguem assistindo a concertos e frequentando os bares boêmios. Jovens chilenos e suecos frequentam os seus centros acadêmicos tanto, ou mais, do que meio século atrás.
Claro, ainda há vida estudantil na PUC-SP, nas “Arcadas”, em algumas faculdades cariocas e em alguns outros pontos de nosso país. Mas estão em extinção, da mesma forma que a onça pintada e o lobo-guará.
A verdade é que a vida no Brasil, em geral, está ficando muito chata. E, em particular, para os nossos jovens: sem espaços de plena convivência, sem empregos dignos, sem educação de qualidade, enjaulados nos quartos em companhia de celulares e notebooks, aturdidos pelas vozes de pastores que falsificam a palavra da Bíblia…
Não por acaso, os que podem vão para o exterior antes que o coração fique inapelavelmente vazio de poesia e de alegria.

NEY VILELA

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